sábado, 2 de fevereiro de 2019

Yurikuyuvakae

No início havia um homem chamado Yurikuyuvakae. Ele não tinha pai nem mãe e caminhava solitário pelo mundo. Assim começou a narrar na língua Terena o ancião Guilherme Felipe Valério, morador na Terra indígena de Dourados, às professoras Noemi e Lidimara Francisco durante a formação continuada do projeto Ação Saberes Indígenas na Escola.
Este mito é contado e recontado, no decorrer do tempo, por comunidades do povo terena nas terras indígenas de Mato Grosso do Sul e em outros estados onde esta etnia também está presente, segundo as professoras Celia Reginaldo Faustino e Cristiane Machado da Silva. Os Terena no Mato Grosso do Sul são mais de 23 mil pessoas e em Dourados somam pelo menos 4 mil.
De acordo com o mito, em uma floresta, onde havia muitos pássaros e outros animais, em uma grande árvore, um Bem-Te-Vi cantava assim: - Bem-te-vi, bem-te-vi, bem-te-vi! Mas o homem entendia: “bem-que-eu-vi”. Então, foi se aproximando da árvore e notou que o pássaro cantava olhando para o chão. Foi quando ele avistou uma cabeça saindo de um buraco na terra.
O Bem-Te-Vi continuava a cantar e no segundo dia de caminhada o homem avistou a segunda cabeça. No terceiro dia, aproximou-se da árvore, e o pássaro cantava novamente: - Bem-te-vi, Bem-te-vi, Bem-te-vi!
Logo, Yurikuyuvakae viu uma cabeça e um corpo. Ordenou, então, que todos saíssem do buraco. Viu que eram pessoas, mas não conseguiu se comunicar com elas. Depois disso, Yurikuyuvakae convidou a todos para ir para a mata, onde disse:
- Eu sou da mata e vocês são da terra. Vou chamá-los de Terena, o povo que saiu de dentro da terra.
Esta história e muitas outras foi compilada pelos professores Terena da Reserva Indígena de Dourados que fica no cone sul de Mato Grosso do Sul. Um pequeno território com aproximadamente 3.500 hectares onde vivem confinadas mais de 15 mil indígenas das etnias Kaiowá, Guarani e Terena. Na região funcionam oito escolas indígenas.

P.s.: A ação saberes indígenas na escola e muitas outras encontram-se descontinuadas pela atual gestão do Ministério da Educação sob o pretexto de desideologizar a alfabetização, extinguindo de uma canetada só a Secretaria de Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) e a Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena (CGEEI). Estes espaços administrativos foram conquistados pelos povos indígenas a partir de suas sugestões nas duas conferências nacionais de educação escolar indígena (CONEEI) com o objetivo de garantir a interlocução com Estado brasileiro sobre os rumos da educação escolar indígena. A terra começa a ficar plana pelo Brasil nas mãos dos criacionistas.
Fonte: Ação Saberes Indígenas na Escola.
Iconografia: Turí ne terenoehiko, 2018.

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