segunda-feira, 22 de abril de 2019

ACAMPAMENTO TERRA LIVRE NA MIRA


O 16º Acampamento Terra Livre (ATL), maior encontro de líderes indígenas do país, reunirá neste ano 5000 indígenas sob grande animosidade em Brasília.

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) chamou o Acampamento de encontrão em suas redes sociais e disse que a conta da hospedagem e alimentação dos índios será paga pelo contribuinte, anunciando que a “farra” acabaria em seu governo. Na última quarta-feira (17), o governo federal foi além e autorizou que a Força Nacional faça a segurança dos ministérios e Praça dos Três Poderes durante o evento indígena.
A coordenadora-executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sônia Guajajara, afirmou que é a primeira vez que há uma antecipação para dificultar a chegada das delegações indígenas a Brasília. Os participantes começarão a chegar nesta terça (23) e permanecerão na capital até sexta-feira (26).
As despesas com transporte e alimentação são custeadas com doações, reforçou Sônia Guajajara. Durante o evento também ocorrerão reuniões de mulheres, comunicadores e dos professores indígenas com o Ministério da Educação.
Os movimentos sociais indígenas constituem segmento da sociedade brasileira, múltiplo e diverso, associado pelos cientistas sociais à defesa da cidadania e organização em defesa dos interesses coletivos, pautado em valores como altruísmo (jopói), em oposição aos outros dois segmentos que buscam assegurar a racionalidade do poder, o controle social e a (des)ordem econômica (sãmbyhyha). Neste contexto é compreensível o estranhamento entre o Acampamento Terra Livre e o Estado brasileiro.
Este estranhamento tem uma (des)razão: a dívida histórica do Estados nacionais com os povos nativos no Brasil, América Latina e do mundo. A dívida história é vergonhosa porque resulta do racismo institucionalizado.
Os paradigmas de políticas indigenistas para os povos indígenas nos últimos séculos de colonização oscilaram dentro do espectro da conquista, pacificação, integração e autonomia. Estes modelos não se sucederam cronologicamente, havendo interpenetração entre as fases que vão se somando, de modo anacrônico e recambiante, até o presente, conforme apontam os registros da Conferência Nacional de Política Indigenista (CNPI) e das duas Conferências Nacionais de Educação Escolar Indígena (CONEEI).
A resistência é secular, mas o movimento indígena data de fins dos anos 1960, quando lideranças indígenas de várias regiões do País, com o apoio de organizações indigenistas como a Operação Amazônia Nativa (OPAN) e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), começaram a realizar Assembleias Indígenas Intertribais para a discussão de seus problemas. À medida que aumentava o número destas assembleias, crescia no cenário nacional a presença de líderes indígenas como Mário Juruna, os Kretan, Xangrí e Raoni.
Este movimento tornou-se necessário e mais intenso com as práticas de genocídio indígena que se intensificaram durante os projetos desenvolvimentistas do Regime Militar brasileiro (1964-1985) e que produziram a morte de mais de 8000 indígenas segundo levantamento da Comissão Nacional de Verdade (CNV).
Por outro lado, as conquistas indígenas que resultaram nos direitos fundamentais reconhecidos na Constituição Federal de 1988 e disposições transitórias não foram cumpridas pelo Estado brasileiro e estão mais ameaçadas que nunca no período democrático. O atual presidente, por exemplo, em cumprimento à promessa de campanha de que não haveria mais um milímetro de terra para índios, esvaziou a Funai (Fundação nacional do Índio) e destinou ao Ministério da Agricultura atividades executadas pelo órgão indigenista nos últimos 30 anos: a identificação, delimitação e demarcação de terras indígenas no país.
A mudança foi imposta por medida provisória no bojo da reestruturação administrativa do governo federal e divulgada em Diário Oficial no dia 01 de janeiro, poucas horas após sua posse.


REFERÊNCIAS E FONTES:
URIBE, Gustavo. Acampamento Terra Livre. São Paulo: FSP, 20/04/2019.
VALENTE, Rubens. Bolsonaro retira da Funai a demarcação de terras indígenas. São Paulo: FSP, 01/01/2019.

NOTAS:
1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karaí Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
2. A grafia adotada para as palavras tupi e guarani seguem a forma adotada pelas fontes consultadas, acrescidas de acentuação para facilitar a pronúncia.
3. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às mídias sociais.
4. Metadados: ATL, Sônia Guajajara, APIB. Imagens: SOUSA, N. ATL 2017. Brasília, 2017.

Nenhum comentário:

Postar um comentário