O XV Acampamento Terra Livre foi encerrado com uma demonstração
da capacidade analítica e posicionamento político dos povos indígenas
brasileiros expresso no documento final de sua Assembleia.
A
introdução do documento divulgado pela APIB, a Articulação dos Povos Indígenas
do Brasil, registrou participação de “4 mil lideranças de povos e organizações
indígenas de todas as regiões do Brasil, representantes de 305 povos, reunidos
em Brasília (DF), no período de 24 a 26 de abril de 2019”.
Os
participantes afirmam indignação contra a política de terra arrasada do atual
governo brasileiro contra seus direitos e repudiam o que chamam de política
governamental de extermínio indígena que segue o modelo do Regime Militar.
Entendem extermínio como falta de territórios e de acesso aos bens naturais,
bases de sua identidade e modo de vida.
Em
sua visão, consideram que a natureza pluriétnica do Estado brasileiro é
desrespeitada e a democracia está ameaçada pelo atual governo. Como premissa de
sua afirmação, evocam o fato dos “ataques orquestrados pela Frente Parlamentar
Agropecuária contra a Mãe Natureza e a discussão da Lei Geral do Licenciamento
Ambiental, em conluio com os ministérios do Meio Ambiente, Infraestrutura e
Agricultura”.
Avaliam
a conjuntura como submissão econômica do governo Bolsonaro a poderosos
interesses de corporações empresariais nacionais e internacionais, ligadas ao
agronegócio e à mineração. Concluem a primeira parte do documento, dizendo que
vivem um cenário sombrio e de morte.
A
superação destas contradições passa pela demarcação de todas as terras
indígenas, bens da União, conforme determina a Constituição e o Decreto 1775/96,
além da revogação da MP 870/19 que transferiu as competências de demarcação das
terras indígenas e de licenciamento ambiental ao Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Lembraram que a Funai necessita de recursos para cumprir suas funções.
O
documento afirma o direito dos povos isolados de viverem ao seu modo, protegidos
pelo Estado e a manutenção do Subsistema de Saúde Indígena do SUS na SESAI.
Reafirmam que a efetivação da política de educação escolar indígena
diferenciada depende da implementação das 25 propostas da segunda Conferência
Nacional e dos territórios etnoeducacionais.
Recomendam
a recomposição da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena estrutura
administrativa do Ministério da Educação. Denunciam falta de infraestrutura nas
escolas indígenas, solicitam a formação e contratação de professores indígenas
e incentivo à elaboração de material didático diferenciado.
A
categoria presente em todo o documento final é a do Bem Viver. Segundo os
participantes da Assembleia a extinção da CNPI, Conselho Nacional de Política
Indigenista pelo Decreto 9.759/19 prejudicou a interlocução e o monitoramento
das políticas públicas específicas e diferenciadas.
De
acordo com as lideranças indígenas, o fim da violência e da discriminação passa
pelo arquivamento de todas as iniciativas legislativas anti-indígenas, tais
como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00 e os Projetos de Lei (PL)
1610/96, PL 6818/13 e PL 490/17, voltadas a suprimir os direitos fundamentais:
direito à diferença, aos usos, costumes, línguas, crenças e tradições, o
direito originário e o usufruto exclusivo às terras tradicionalmente ocupadas.
O
texto recomenda ao Estado brasileiro a aplicabilidade dos tratados
internacionais assinados pelo Brasil e recomendações: Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), as Convenções da Diversidade
Cultural, Biológica e do Clima, a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos
Indígenas, Declaração Americana dos
Direitos dos
Povos Indígenas, recomendações da Relatoria Especial da ONU para os povos
indígenas enviadas ao Brasil por ocasião da Revisão Periódica Universal (RPU).
Manifestam
ao Supremo Tribunal Federal (STF) a expectativa de acolhimento da tese do
Indigenato (Direito Originário) e que exclua, em definitivo, a acolhida da tese
do Fato Indígena (Marco Temporal).
Concluem
dizendo que estão vivos e permanecem em luta, sempre comprometidos a fortalecer
alianças no campo e na cidade que também têm seus direitos atacados. “Resistiremos,
custe o que custar!”, afirmam no encerramento da carta.
REFERÊNCIAS E FONTES:
APIB. Documento
Final do XV Acampamento Terra Livre. Brasília, 2019.
NOTAS:
1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor
em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karai
Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
2. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às
mídias sociais.
3. Metadados: ATL,
Documento Final. Imagens: Mobilização
Nacional Indígena. ATL 2019. Brasília, 2019.
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