sábado, 27 de abril de 2019

FILOSOFIA INDÍGENA: UMA MOSTRA.


O XV Acampamento Terra Livre foi encerrado com uma demonstração da capacidade analítica e posicionamento político dos povos indígenas brasileiros expresso no documento final de sua Assembleia.
A introdução do documento divulgado pela APIB, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, registrou participação de “4 mil lideranças de povos e organizações indígenas de todas as regiões do Brasil, representantes de 305 povos, reunidos em Brasília (DF), no período de 24 a 26 de abril de 2019”.
Os participantes afirmam indignação contra a política de terra arrasada do atual governo brasileiro contra seus direitos e repudiam o que chamam de política governamental de extermínio indígena que segue o modelo do Regime Militar. Entendem extermínio como falta de territórios e de acesso aos bens naturais, bases de sua identidade e modo de vida.
Em sua visão, consideram que a natureza pluriétnica do Estado brasileiro é desrespeitada e a democracia está ameaçada pelo atual governo. Como premissa de sua afirmação, evocam o fato dos “ataques orquestrados pela Frente Parlamentar Agropecuária contra a Mãe Natureza e a discussão da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, em conluio com os ministérios do Meio Ambiente, Infraestrutura e Agricultura”.
Avaliam a conjuntura como submissão econômica do governo Bolsonaro a poderosos interesses de corporações empresariais nacionais e internacionais, ligadas ao agronegócio e à mineração. Concluem a primeira parte do documento, dizendo que vivem um cenário sombrio e de morte.
A superação destas contradições passa pela demarcação de todas as terras indígenas, bens da União, conforme determina a Constituição e o Decreto 1775/96, além da revogação da MP 870/19 que transferiu as competências de demarcação das terras indígenas e de licenciamento ambiental ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Lembraram que a Funai necessita de recursos para cumprir suas funções.
O documento afirma o direito dos povos isolados de viverem ao seu modo, protegidos pelo Estado e a manutenção do Subsistema de Saúde Indígena do SUS na SESAI. Reafirmam que a efetivação da política de educação escolar indígena diferenciada depende da implementação das 25 propostas da segunda Conferência Nacional e dos territórios etnoeducacionais.
Recomendam a recomposição da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena estrutura administrativa do Ministério da Educação. Denunciam falta de infraestrutura nas escolas indígenas, solicitam a formação e contratação de professores indígenas e incentivo à elaboração de material didático diferenciado.
A categoria presente em todo o documento final é a do Bem Viver. Segundo os participantes da Assembleia a extinção da CNPI, Conselho Nacional de Política Indigenista pelo Decreto 9.759/19 prejudicou a interlocução e o monitoramento das políticas públicas específicas e diferenciadas.
De acordo com as lideranças indígenas, o fim da violência e da discriminação passa pelo arquivamento de todas as iniciativas legislativas anti-indígenas, tais como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00 e os Projetos de Lei (PL) 1610/96, PL 6818/13 e PL 490/17, voltadas a suprimir os direitos fundamentais: direito à diferença, aos usos, costumes, línguas, crenças e tradições, o direito originário e o usufruto exclusivo às terras tradicionalmente ocupadas.
O texto recomenda ao Estado brasileiro a aplicabilidade dos tratados internacionais assinados pelo Brasil e recomendações: Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), as Convenções da Diversidade Cultural, Biológica e do Clima, a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Declaração Americana dos 
Direitos dos Povos Indígenas, recomendações da Relatoria Especial da ONU para os povos indígenas enviadas ao Brasil por ocasião da Revisão Periódica Universal (RPU).

Manifestam ao Supremo Tribunal Federal (STF) a expectativa de acolhimento da tese do Indigenato (Direito Originário) e que exclua, em definitivo, a acolhida da tese do Fato Indígena (Marco Temporal).
Concluem dizendo que estão vivos e permanecem em luta, sempre comprometidos a fortalecer alianças no campo e na cidade que também têm seus direitos atacados. “Resistiremos, custe o que custar!”, afirmam no encerramento da carta.

REFERÊNCIAS E FONTES:
APIB. Documento Final do XV Acampamento Terra Livre. Brasília, 2019.

NOTAS:
1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karai Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
2. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às mídias sociais.
3. Metadados: ATL, Documento Final. Imagens: Mobilização Nacional Indígena. ATL 2019. Brasília, 2019.

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