A árvore conhecida como louro é muito comum nas florestas
onde vive o povo guarani, sendo conhecida neste idioma como Aju’y, nome antigo que
ainda se conserva entre os falantes.
A palavra em guarani vem da aglutinação de dois termos: yvyrá, coluna de madeira, esteio, ju’y,
amarelo. Aju’y seria coluna ou mastro de madeira amarela. Trata-se de muitos
tipos de árvores, uma delas conhecida como Aju’y
Hû, louro negro.
O sufixo ju, nas tradições religiosas dos Mby’á do Guairá,
está associado a eterno, milagroso, indestrutível. Este termo agregado à árvore
confere o sentido de mastro, coluna milagrosa.
O guarani mbyá Cantalicio, mburuvicha de Yvypytã (Guairá,
Paraguai), legou o seguinte relato cosmogônico relacionado a esta árvore:
"O ser supremo, Nhande
Ru Papa Tenonde, assumiu a forma humano em meio às trevas originárias; sentou-se
no banquinho, apyka, com sua cabeça
enfeitada pelo jeguaka, diadema de penas, símbolo da masculinidade, e com seu
xiru, bastão ritual, símbolo do poder na mão direita; colocou-se a observar a
escuridão extrema e infinita do caos, pytũ
ymã, antes de começar a tarefa da criação.”
"olhou para o oriente, de onde veio a abóbada celeste, o
primeiro paraíso, Yva rypy Tenonde,
que foi dividido em quatro regiões: a primeira, no sol nascente, é o principal
dos paraísos, yváy, morada de Karai Ru Ete, criado simultaneamente com esta
região da abóbada. Karai Ru Ete é o deus do fogo, dono do Som do Crepitar das
Chamas, Tataendy Ryapu Ja. Karai Amba, morada de Karai, é o nome
que aplicamos a esta região dos céus.”
"A segunda região se estende da morada de Karai Karai
Ru Ete até o zênite, o centro dos paraísos originários, Yva rypy mbyte, morada de Jakairá
Ru Ete, criado também simultaneamente com seu paraíso ou Ambá. Jakaira Ru
Ete é o dono da neblina vivificante, tatachinã,
que aparece todos os anos no início da primavera para transformar o ano velho
em ano novo, infundindo vida em todos os seres.”
"A terceira região, que envolve o centro da abóbada e
se estende de ambos os lados do zênite, é o paraíso de Ñandu Ru Ete, Deus do
Sol. É Ñamandu Ru Ete a quem devemos a vida; sem ele não haveria a existência; a
ele o invocamos diariamente antes de empreender nossas expedições de caça ou
entrar na mata em busca de mel; ele é fonte de toda a vida e pai dos deuses, invocado
diariamente nos rituais.”
"So Paraíso de Ñamandu Ru Ete até o horizonte é o Paraíso
de Tupã Ymã, deus dos raios, torvões,
chuvas e granizo, dono do mar e de todas as águas. Seu paraíso, o sol poente, é
chamado de Tupã Ambá, morada de Tupã, a ele se chama Tupã Ru Ete.”
"Concluída a tarefa de criar a abóbada celeste e os
grandes deuses que se converteram em donos, jára, do Universo, Nosso Primeiro Pai começou a criar a terra,
fazendo emergir do meio das trevas uma árvore milagrosa, yvyra ju’y ratã, coluna milagrosa de madeira dura, para apoiar nela
a massa de matéria que ia surgindo entre seus dedos. Logo depois criou cinco
palmeiras eternas, Pindovy, uma, na morada
de Karaí, uma na de Tupã, uma no
centro da terra e outras duas, uma no norte e outra no sul; sobre estas palmeiras
eternas assentam-se os fundamentos do universo.”
"Entre galhos do aju’y
chiava um pequeno gafanhoto verde, tuku
charãrã’i; um beija-flor, mainomby,
voava ao redor do criador ajudando suas tarefas; enquanto uma coruja pequena, urukure'a, o protegia dos raios do sol que
já brilhava no firmamento. Estes três seres, o gafanhoto, o tatu pequeno; a
víbora pequena, mbói ymã o ñandurie; a ynambu pytã, perdiz grande dos
campos, são so únicos seres animados que não são reencarnação de seres humanos
que sofreram castigos.”
"O aju’y é a imagem, ta'anga,
da coluna eterna, imperecível, de madeira dura, yvyra ju’y ratã, criada por Ñande Ru para sustentar a terra; por
isso, aqueles que ainda seguem os preceitos dos antepassados, a utilizamos
preferencialmente para a construção de nossas casas nos lugares em que não há
abundância de cedro, Yvyra Ñamandu;
criado por nosso Pai Ñamandu".
REFERÊNCIAS E FONTES:
AQUINO, Valdomiro. Nhanderu
Kaiowá. Aldeia Panambizinho, 2019.
Cadogan, León.
Ayvu Rapyta. São Paulo: USP, 1959.
Clastres, Pierre. A Fala Sagrada. Campinas: Papirus, 1990.
CONSCIANZA, Roseli. Nhandesy Kaiowá. Aldeia Panambizinho,
2019.
JUCA, Getúlio. Nhanderu
Kaiowá. Aldeia Jaguapiru, 2019.
Montoya,
Antonio Ruiz de. Tesoro de la Lengua
Guaraní. Madrid, 1639. https://bit.ly/2D41hQS
Nimuendaju,
Kurt. As Lendas da Criação e Destruição do Mundo. São Paulo: Hucitec,
1987.
CADÓGAN,
León. TRADICIONES GUARANÍES EN EL FOLKLORE PARAGUAYO. FRAGMENTOS DE
ETNOGRAFÍA MBYÁ-GUARANÍ. Asunción: Centro de Estudios Paraguayos “Antonio
Guasch”, Asunción-Paraguay, 2003.
NOTAS:
1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor
em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karaí
Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
2. A grafia adotada para as palavras tupi e guarani seguem a
forma adotada pelas fontes consultadas, acrescidas de acentuação para facilitar
a pronúncia.
3. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às
mídias sociais.
4. Metadados: Yvy Marane’y, Terra sem Males, Jakairá,
aguyjê, yváy. Imagens: Pontos cardeais;
louro (aju’y); cedro;
REDES SOCIAIS
A árvore
conhecida como louro é muito comum nas florestas onde vive o povo guarani,
sendo conhecida neste idioma como Aju’y, nome antigo que ainda se conserva
entre os falantes. http://labhei.ning.com/forum/topics/yvyra-ju-y-o-esteio-da-terra
muito legal esse mito :)
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